Os incêndios florestais em Portugal, são anualmente uma preocupação constante durante o verão, uma calamidade que afeta tanto o meio ambiente quanto as populações locais, trazendo consigo uma série de consequências graves a curto e longo prazo, Carlos Guimarães Eng.
Florestal, Especialista em Incêndios Florestais e ex-vice-presidente dos Bombeiros do Estoril, faz uma análise de alguns procedimentos fundamentais para a prevenção e combate aos incêndios no concelho de Cascais.
Cascais, nos últimos anos, tem sido assolado por alguns incêndios em áreas de mato e floresta. Esses incêndios podem ser resultantes de uma combinação de vários fatores, como nos explica o Eng. Carlos Guimarães, “as condições meteorológicas adversas, ondas de calor, longos períodos de seca e ventos fortes, que são comuns em algumas épocas do ano nesta zona”. Para que um incêndio inicie é necessário haver uma ignição, a maioria das vezes por ação humana ou causas naturais, “90 a 95% a ignição é provocada pelo homem, 5% ou 10% por acidente, como foi o exemplo do ano passado na localidade do Zambujeiro, com a queda de um cabo elétrico. Podemos dividir as ignições em 3 lotes, por exemplo, a tradicional queimada em terrenos agrícolas, perde-se o controlo e é considerado um fogo por negligência, aqui não acontece muito, mas em zonas do interior e norte é comum.
Outra ação é a mão criminosa, ou seja, um loco, um pirómano, que provoca um incêndio pelo prazer de ver arder, presenciar a ação dos bombeiros e por último os incêndios que são provocados com dolo e com um objetivo, por exemplo provocar dano ao vizinho, por
partilhas de terrenos (acontece muito no Norte), e a especulação imobiliária, para acabar com a floresta e com os matos para eventualmente construir”.
Em muitos países e Portugal não é exceção, existem leis e regulamentos que impedem a utilização de áreas recentemente atingidas por incêndios florestais para fins de construção ou para outros usos, que possam alterar significativamente o uso do solo. Por exemplo, a Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96) e outros regulamentos específicos, estabelecem que após um incêndio florestal, a área afetada não pode ser utilizada para fins de construção por um período determinado de 10 anos. Essa proibição é uma
medida preventiva para evitar que os incêndios sejam provocados intencionalmente com o objetivo de mudar o uso do solo, para desenvolvimento urbano ou agrícola, “rapidamente vai regenerar, mas, em 10 anos um pinhal não se faz, onde aconteceu este último fogo em Murches, vai demorar mais de 20 anos para se conseguir ter a mesma estrutura florestal que tínhamos”.
A prevenção
A prevenção de incêndios é uma ação que envolve um conjunto de medias e práticas destinadas a evitar a ocorrência de incêndios, minimizando sempre o risco da eclosão e propagação. A prevenção passa também, por analisar as áreas mais propícias a incêndios e criar estratégias em colaboração com as entidades locais e a comunidade. O Eng. Carlos Guimarães foi um dos criadores dos sapadores florestais. Tinha como objetivo equipar os veículos dos produtores florestais com um kit de primeira intervenção, para que pudessem atuar na fase inicial do incêndio, “logo que haja um incêndio, os carros que tiverem nas imediações arrancam para o fogo e não são bombeiros, o objetivo aqui não é apagar o fogo, mas é conter o fogo até à chegada dos bombeiros, ou seja, não deixar que o fogo passe de pequenas para grandes dimensões e que possa ficar descontrolado, com a chegada dos bombeiros, a partir determinada altura eles deixam de ter qualquer utilidade no combate ao fogo, e com a ajuda das máquinas agrícolas, fazem abertura dos roços e corta fogos”.
As Autarquias também têm responsabilidades na implementação de políticas e ações específicas definidas no Plano Municipal de Defesa da Floresta, para reduzir o risco de incêndios, “a propriedade privada é um direito mas, a Autarquia pode obrigar a fazer as limpezas dos matos e fazer a monitorização constante, por exemplo o Plano Municipal de Defesa da Floresta de Cascais está muito bem elaborado, muito detalhado e quando ocorre um incêndio é acionado o plano e todos os intervenientes sabem o que têm de fazer, mas
mesmo com este plano vai haver sempre fogos, por que há sempre alguém que age com dolo”. Outra medida de prevenção é a criação de postos de vigias, nas zonas de mato em Cascais, uma vez que não tem declives acentuados e é de fácil visualização, conforme afirma o Eng. Carlos Guimarães.
Incendio de Murches
Os alarmes soaram por volta das 13h20 do dia 21 de julho. Dezenas de bombeiros de várias corporações, deslocaram-se rapidamente para o local, o incêndio supostamente teve início uma hora antes. O Eng. Carlos Guimarães faz uma análise, “há três fatores para que o fogo exista, quando a temperatura é superiores à humidade ou seja, a temperatura ultrapassa os 34º a humidade baixa dos 30%, esse normalmente é um ponto de alarme, outro fator é o número de dias decorridos desde as últimas chuvas e a por último a velocidade do vento, naquele dia a temperatura duvido que estivesse superior à humidade,
porque ainda havia muita humidade no ar, não decorriam muitos dias das ultimas chuvas, portanto os matos estavam húmidos, o que aconteceu foi que havia muito vento, logo se a chama ficar inclinada devido ao vento, o fogo está a secar o mato à frente, e encontra sempre matos secos e arde com mais facilidade”.
Desde o último incêndio em julho do ano passado, a Autarquia criou uma linha de contenção para prevenção, que foi favorável ao incêndio deste ano, “este fogo particularmente só não passou para o lado do fogo do ano passado, porque foi feita uma linha de contenção, ou seja, linha de descontinuidade de combustível, isso é fundamental fazer nas florestas para o fogo ao progredir encontre obstáculos à sua progressão”, afirma.
Os bombeiros em situação real
Os bombeiros são frequentemente lembrados como heróis no combate aos incêndios, e com razão. Eles desempenham um papel crucial, na maioria das vezes perigoso na proteção de vidas, propriedades e do meio ambiente. Mas a falta de bombeiros é uma realidade, devido a vários fatores, “há falta de bombeiros, também não há muitas pessoas a querer ser bombeiro, porque a profissão de bombeiro também não é devidamente recompensada não só financeiramente, como a própria carreira de bombeiro, apesar de ser mais respeitada pelo povo, mas ninguém trabalha para remunerar os bombeiros”, afirma Eng. Carlos Guimarães.
Os bombeiros são uma profissão que continuam em constante atualização dos seus conhecimentos e especializam-se em diversas áreas, consoante o meio onde atuam, para responder eficazmente às diferentes emergências que possam surgir, “todos tem formação, enquanto fui Vice-presidente dos Bombeiros do Estoril, sempre lutei para dar melhores condições aos bombeiros, condições financeiras, melhorar a qualidade da profissão do bombeiro e tornar também mais atrativa”, mas atualmente é difícil porque o apoio é cada vez mais escasso, mas mesmo assim, “têm uma alma enorme, uma coragem enorme, um atrevimento as vezes até exagerado, arriscando de mais do que deviam arriscar”, refere.
Cascais atualmente conta com cinco corporações de bombeiros, atuam consoante as emergências para as quais são solicitados, combate a incêndios, resgaste e salvamento, emergências médicas, prevenção e inspeção, assistência em desastres naturais e outras emergências. Na maioria das vezes em intervenção urbana, a especialização em incêndios florestais acaba por não ser uma necessidade exclusiva e permanente, “os bombeiros do concelho de Cascais, 99% da sua atuação é em meio urbano, de certeza que combatem
mais incêndios urbanos do que florestais, especializar bombeiros em fogos florestais não é o principal, porque vão trabalhar 1% do que trabalham anualmente”, conclui.
Bruno Taveira